12 maio 2009

Novos Olhares pela Educação

criança

Palavras do Pró-Reitor

Prof. Dr. Marcos Laffin – Pró-reitor de ensino de graduação – UFSC/SC.

ABERTURA DO SEMINÁRIO SOBRE POLÍTICAS DE INCLUSÃO – Cotas e Ações Afirmativas – UFSC 01-06-2006

É com plena satisfação que a UFSC acolhe, nesta data, as discussões e as manifestações de diferentes expressões sobre Políticas Públicas de Inclusão.

O tempo pode parecer vencido no adiantado da hora, quando pensamos ser – o interior das instituições públicas, sobretudo as universidades – o espaço para os debates e os confrontos das demandas sociais.

Dilatado no tempo, porque assim nos constituímos como corpo institucional que lê a realidade de forma diversa, e muitas vezes não a lê, enfim chegamos, para ver nas possibilidades, que o cenário da inclusão lateja no universo público, espaço esse de direito e único para a manifestação da diversidade.

Constatamos, talvez com maturidade, que o complexo desafio do novo, do diferente, do antes não-pensado impõe, com sua presença de argüição, a necessidade de desvelamento.

Chegamos, talvez com a autonomia da pluralidade, para dizer das certezas, das dúvidas, dos pré-conceitos, das confusões. Entretanto chegamos, sobretudo como disse Gramsci, com o otimismo da vontade, para ouvir o contraditório e a partir dele refazer o que é próprio do espaço público, que diz que se pensa e se repensa em suas ações.

O histórico desse evento precede a muitas tentativas: individuais, a dois, nos quais foram se somando outros dois e que depois se identificam como Gislene, Sérgio, Milton, Josiane, Maria Cristina, Vânia, Valmir, Patrícia, Ilka,Marcelo, Frederico, Sinésio, Júlio, Olinto, Carlos, José, Leonardo, Maria Izabel, Marta, Marcos. (Ver portaria com nome completo.)

Uns se perderam; outros não se reconheceram; outros chegaram. Outros, chegamos.

O tempo e o contexto até aqui condensado, numa fala aparentemente generosa, contêm muito daquilo que Paulo Freire já dizia:

“Em meus olhos de amorosidade, não descarto o rigor científico. Tais marcas, me conduzem ao resgate das hesitações, opções e desacertos. Não para condenar, mas para recriar”.

Não há como recuar. Agora não! Ou há? Não há como recuar de uma decisão. Não há como não fazer uma opção.

Existem ainda, Navios Negreiros que se põem à nossa frente, ao nosso redor, que nos indagam sobre a história, sobre a constituição da condição humana, sobre a construção da história e da realidade da sociedade brasileira.

“Estamos em pleno mar. Negras mulheres. Magras crianças. Uma multidão faminta embrutece”. “Levanta, herói do novo mundo: Colombo, fecha a porta do teu mar“.

Castro Alves, São Paulo, 1868.

Quem é o herói desse tempo de exclusões? Estamos nos debatendo neste mar da educação.

Mas é preciso dizer, para saber, que a inclusão educacional é uma questão de responsabilidade social. Não aquele termo irresponsável, banalizado e precarizado pelo avesso do discurso. Mas o responsável como participante, envolvido em políticas públicas que atendam a magras crianças, que se levantam como sobreviventes de nossas práticas educativas.

Nossas práticas? Certamente diremos: ” minha não!” Talvez ali esteja localizado: “Colombo, fecha a porta do teu mar!”

Negar a realidade. Negar a história. Negar o cotidiano é negar também a melhoria da educação básica como melhor condição de acesso ao ensino superior e à qualidade de ensino.

E por que então temos de gerar ações afirmativas? E por que ações afirmativas na universidade?

Porque temos produzindo muitas ações negativas: a escola excludente, a escola que branqueia, a escola que seleciona, a escola que reprova, a escola que se forma pasteurizada, a escola que não se reconhece na diversidade.

Do mirante que eu olho, vejo o mirante dos excluídos. E desse mirante o que eu vejo é uma instituição fracassada, porque agora se quer em cotas, mas nega a moradia, nega o nivelamento, nega a bolsa, nega o restaurante universitário, nega vagas, gerando novos núcleos de marginalizados.

”Colombo, fecha a porta do teu mar!” Quem sabe não esteja eu sendo muito agreste, muito selvagem com as instituições públicas? Não! Minha fala é de essência. Essência – não de natureza humana – mas de condição humana.

E é de condição humana porque as instituições escolares ensinaram que coube ao branco domesticar, que coube ao branco recuperar o atraso. A história nos mostra isso. A história se fez também nessa condição.

Então precisamos de ações afirmativas para instituir o diferente no debate hegemônico da escola.

Precisamos de ações afirmativas para não enquadrar o diálogo necessário no modelo estruturado de universidade.

Precisamos de ações afirmativas, não como políticas compensatórias; precisamos de ações afirmativas para negar que a diversidade deva ser compreendida como desvio, como algo a ser corrigido.

Precisamos de ações afirmativas para dizer que a diversidade é condição.

Diversidade é valor cultural e, nela, a inclusão não se abafa, não se ignora.

Diversidade como valor cultural é direito a uma cidadania plural.

Diversidade como valor cultural exige novos percursos acadêmicos, políticas inovadoras. Diversidade como valor cultural exige decisão.

Estou sobre o eixo da razão e da sensibilidade, contudo me guio tendo a generosidade humana como uma possibilidade nas minhas decisões.

Então, agora tomo para mim o discurso: o eu na primeira pessoa. O Eu de um coletivo. O eu que, como o nós, constitui-se pela diversidade.

Quero ser um cidadão brasileiro acolhido na sociedade, mas acolhido na diversidade.

Diversidade que pensa, que propõe, que exige políticas pontuais sem perder a dimensão de políticas universais.

Então, qual é a responsabilidade da instituição universitária nesse processo?

De não se assustar com o novo, mas de assumir o compromisso de construir o novo. De saber que o novo se apresenta com a amplitude dos desafios que não podem imobilizar as possibilidades.

Portanto, o mirante da universidade, para construir o novo, não pode ser apenas de consulta da sua comunidade, porque ela é inclusa, porém precisa, sobretudo, consultar o sujeito, a comunidade, o universo diverso.

E para não dizer que não falei, perguntarei: Qual é a nossa ferida narcisista? Nossa ferida narcisista é de que a verdade não existe. Ela é sempre relativizada, porque depende sempre de onde estamos olhando.

Uma pérola poderá ser falsa se estivermos olhando o objeto precioso do adorno, Mas em sendo a pérola falsa porque não surgiu do molusco, poderá ser então uma verdadeira bijuteria. Portanto, o critério da verdade, da nossa ferida narcisista, não está na verdade que esposamos, mas na condição por que nos espelhamos.

Para concluir quero enfatizar que:

“As relações humanas são tecidas por complexidades justamente porque o ser humano não é somente uma tipologia humana, somente social ou somente econômico, ou somente racial, mas sim constituído de múltiplas dimensões, com realidades sempre profundas em que a magia da vida não pode ser reduzida a compartimentos ou racionalidades.

A multidimensionalidade humana é constituída também de uma consciência humana que se constrói e se manifesta em diferentes níveis, os quais estão intrinsecamente vinculados às suas condições materiais e sócio-culturais. As ações humanas decorrentes dos diferentes níveis de consciência, apreendidos historicamente, mostram-nos, como enfatizou Edgar Morin, que “uma das maiores aquisições da consciência contemporânea passou a ser a consciência dos limites” (MORIN, 1999, p. 49).

E é justamente pela consciência dos limites da ação humana que não experenciamos somente racionalidades, mas sobretudo complexidades. E esta complexidade engendra racionalidades e poesia, que não comporta reduzir-se o humano à promessa do progresso científico.

Nessa mesma dimensão tanto o ser econômico, político, social, diverso, assim como o poeta, não

precisam se fechar no território restrito e confinado dos jogos de palavras e símbolos. O poeta possui uma competência total, multidimensional, que concerne à humanidade e à política, mas não pode se deixar submeter à organização política. Sua mensagem política implica ultrapassar o político (MORIN, 1999, p. 39), porque não cabem mais, na sociedade humana, espaços de anonimato nem de isolamento, mas construções de coletividades, com todas as suas contradições, como espaços éticos de responsabilidade e de convicções.

Essa ressignificação do território humano se faz necessária, em função de que, talvez, estejamos, na leitura de Morin,

perdidos num planeta suburbano, de um sol suburbano, de uma galáxia periférica, de um mundo desprovido de centro. Mesmo assim, possuímos plantas, pássaros, flores, assim como a diversidade de vida, as possibilidades do espírito humano. Doravante, aqui residirão nosso único fundamento e nosso único recurso possível (MORIN, 1999, p. 41).

O homem, em suas tessituras com outros homens, se faz sábio na consumação dos caminhos da sua autodeterminação que inclui, entre as múltiplas possibilidades, a sua condição ética, afetiva, social, econômica e poética.

Nesse contexto, é preciso transformar a dimensão substantiva em espaços diversos, nos quais o ser humano possa constituir sua autonomia e desfrutar de valores emancipatórios.

”Logo, transformar a vida é, para nós, narcisos institucionalizados, transformar os ambientes institucionais em tempos para se viver feliz, com uma vida decente, nesta galáxia periférica”. LAFFIN, 2005.

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