12 maio 2009

Jornal da Ciência

Órgão da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência

criança

Crianças superdotadas são, antes de mais nada, crianças

Psicologia moderna tira a imagem de gênio e a substitui pela de meninos e meninas com habilidades especiais.
Lisandra Paraguassú escreve para ‘O Estado de SP’:
Eles não são gênios, mas estão muito acima da média. Nas conversas, usam vocabulário e exprimem idéias que deixam tontos muitos adultos.
Crianças superdotadas - sinônimo de pequenos Einsteins e Mozarts no imaginário da maior parte da população - são especiais sim, têm habilidades a serem desenvolvidas, mas são, antes de mais nada, crianças.
A moderna psicologia educacional tira a imagem de gênios e a substitui pela de meninos e meninas com habilidades especiais e que devem ser treinados e incentivados.
"Uma criança com superdotação é alguém que tem um alto desempenho em uma área, mas não é um gênio", explica a professora Vera Pereira, coordenadora do programa para superdotados em Brasília.
Hoje, em vez de um simples teste de QI - até há alguns anos a única medida de inteligência -, usam-se avaliações psicológicas que medem as habilidades das crianças em várias áreas.
Os testes são eventualmente feitos e normalmente revelam um QI acima da média, mas são a última etapa em uma avaliação que analisa o comportamento da criança, seus interesses, habilidades orais e físicas e até mesmo a maturidade. Até porque uma criança pode ser extremamente desenvolvida em uma área e nem tanto em outras.
Marina Zambeli dos Reis, de 9 anos, uma das meninas do programa brasiliense para superdotados, quase ficou de fora do projeto porque teve dificuldades em apresentar uma maquete.
Extremamente criativa e com facilidade com as palavras e para inventar histórias e jogos, Marina não tem qualquer habilidade manual.
"Ela tem uma coordenação motora péssima. Quando foi fazer a maquete foi muito ruim. A coordenadora chegou a duvidar que ela pudesse estar no programa', conta Ana Paula dos Reis, mãe da menina.
Marina aprendeu a falar com 1 ano. Com 2, queria aprender piano - e aprendeu. Com 3 anos e meio já sabia ler. Apesar disso, os pais tinham resistência à idéia de colocá-la em um programa para superdotados.
"Eu sou professora, meu marido também. Achávamos que era simplesmente uma questão de ela ter incentivos em casa", conta a mãe.

Resistência
Os pais de Renato Oliveira Melo, de 10 anos, não duvidaram que o filho era diferente. Até porque com 1 ano e 8 meses, ele já sabia todo o alfabeto e identificava as cores. Mas os pais resistiam a tratá-lo como superdotado.
"Até hoje nós evitamos falar no assunto. Não queremos nem que ele comece a achar que é mais do que os outros nem que as cobranças sejam acima do normal. Queremos só que ele seja feliz", diz Vilma Melo, mãe de Renato.
O medo é recorrente entre as famílias de crianças com habilidades especiais. Por isso, o Ministério da Educação (MEC) não incentiva a existência de escolas especiais para superdotados e, sim, a convivência em escolas regulares - mesmo que, muitas vezes, isso se torne um desafio a mais para os professores.
A facilidade para aprender coisas novas, compreender uma explicação e uma memória privilegiada fazem parte das habilidades desses meninos e meninas. Com isso, sua velocidade de aprendizagem é muito maior.
"A maioria das vezes a professora me dá tarefa extra porque eu termino antes e acabo atrapalhando a aula. Mesmo assim eu termino rápido, então as professoras começam a me pedir para ajudar os meus colegas", conta Renato.
A inquietação do menino na escola já lhe rendeu problemas, como brigas com professoras, conta a mãe. "Essas crianças precisam de desafios além da sala de aula. Por isso temos o programa em que elas trabalham uma vez por semana essas habilidades, desenvolvendo projetos", explica Vera Pereira.

Professores
O MEC incentiva os estados a terem programas específicos de identificação de superdotados. Além de Brasília, Minas, Rio e Rio Grande do Sul têm centros para isso. Também as prefeituras de Lavras (MG) e Belém do Pará trabalham com essas crianças.
Algumas escolas, como o Objetivo em SP e a UnB, também têm programas especiais. Em Brasília, os professores das escolas públicas são treinados para identificar crianças com habilidades especiais.
"O professor precisa reconhecer e responder à diversidade, acolher as diferentes potencialidades, características, ritmos de aprendizagem", diz a secretária de Educação Especial do MEC, Cláudia Dutra.
De um modo geral, os professores têm dificuldades de identificar alunos como superdotados. Mas, dizem os especialistas, facilmente apontam aqueles estudantes que aprendem mais rápido, são mais curiosos, perguntam demais. É aí que aparecem os superdotados.
A professora Eunice Alencar, ex-presidente da Associação Brasileira para Superdotados, aponta que essas crianças costumam ser bastante persistentes na busca por mais informações sobre assuntos que as interessam.
Eles chegam a ser chatos em tanto que perguntam. Têm senso de humor e também senso de justiça, reagem positivamente a novos elementos e costumam ter idéias variadas sobre um mesmo assunto. Muitas idéias.
Identificar esse potencial pode, à primeira vista, não ser fácil. Trabalhá-lo, menos ainda. Mas é uma necessidade. "Se esse potencial não é desenvolvido muitas vezes ele pode se perder na fase adulta por falta de incentivo", diz Vera Pereira.

Fonte: (O Estado de São Paulo) Notícia de 12/05/2009

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